Em um momento de intenso debate sobre notícias falsas, gostaria de adicionar outro problema, anúncios falsos. Muitos veículos permitiram que suas páginas fossem preenchidas com anúncios falsos e acredito que isso também tenha um forte impacto em suas marcas e na qualidade de seus serviços.
A publicidade assume várias formas e uma parte significativa é oferecida de forma mais integrada ao conteúdo principal. Comprar programas de teatro ou inserir produtos em filmes e séries são bons exemplos disso.
No caso dos influenciadores, acredito que se possa dizer sem medo de que a maioria dos anúncios seja feita dessa maneira. Portais, blogs e veículos de comunicação não são deixados de fora na web. A maioria deles usa o que chamamos de anúncios originais, uma forma de publicidade que imita o formato e o idioma em que está inserido, muitas vezes se passando por chamadas e artigos sérios do veículo em que aparecem.
O problema não está no uso do próprio formato. Criticar seria semelhante a demonizar um filme de ação pago para usar uma marca de carro na produção de filmes. A discussão que eu gostaria de trazer diz respeito à curadoria e ao impacto potencial que isso teria nos veículos que usam esse método como uma forma de renda.
Exceto alguns portais (caso Twitter e Globo), a maioria dos veículos utiliza redes externas. Um inspecionou vários veículos diferentes e viu que a maioria dos anúncios cheirava a podre.
São estimulantes naturais que aumentam o metabolismo sexual em até 140 vezes. Cápsulas que aliviam a dor e restauram a cartilagem do joelho. Uma pílula que elimina 8 kg de gordura em um mês. Um produto que faz seu cabelo crescer 4 vezes mais rápido, outro que promete 15.000 novos cabelos por mês. Um creme que remove 81% das rugas. Todos que afirmam ter sido certificados pela Anvisa.
O mesmo tipo de lixo que vi durante a noite – e que ainda precisa aparecer – nos comerciais de TV.
Curiosamente, a maioria dos anúncios é do setor farmacêutico e de cosméticos, e dois são os mais regulamentados quando se trata de publicidade.
Drogas milagrosas e enganosas não são o único comprador desses anúncios, também é possível ver produtos criminosos, como dispositivos que permitem assistir a vários canais de TV sem pagar uma taxa mensal.
Se o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) falhou (ou até tentou) resolver esse problema na TV, imagine na internet.
Em alguns veículos, esses anúncios são marcados como publicidade; em outros, não. Eles parecem ser descritos com nomes pomposos como uma “linha do tempo inteligente” que somente quando clicada informa que eles serão oferecidos por terceiros e, “talvez”, “patrocinado”. De qualquer forma, com a confusão de informações, incluindo banners, ícones de mídia social e vários outros elementos, uma parcela significativa das pessoas pode não ser capaz de identificar o patrocínio.
Isso foi demonstrado por um estudo realizado em 2015 pela Contently. Segundo a pesquisa, a maioria dos consumidores dos EUA não consegue determinar qual conteúdo está sendo patrocinado. Em alguns casos, 80% dos consumidores reconhecem alguns dos anúncios que lêem como artigos.
Mas aqui não pretendo iniciar uma discussão sobre segurança do consumidor, deixo isso para Procon e Conar. Minha provocação aqui se refere a marcas.
Entre os clientes deste produto estão algumas das marcas mais respeitadas do Brasil. Eles não se incomodam em aparecer com comerciais enganosos e falsos?
E quando se trata de veículos, a oferta desse tipo de conteúdo em seu site tira sua credibilidade, confiança e prejudica sua marca?
Colocar o veículo como responsável pelo conteúdo do anúncio é muito delicado, para não dizer impossível e injusto, mas, dado o cenário em que vivemos hoje, também não podemos simplesmente ignorar o problema.
Basta olhar rapidamente para entender que é necessário mover a régua para o que é aceitável e o que não é. E, do ponto de vista prático, os veículos podem passar a filtragem para redes que centralizam esses anúncios. Seria o suficiente para desejar.
A maior dificuldade não está na execução, mas no desejo por ela. Os anúncios nativos se tornaram uma linha de receita que alguns veículos não podem ignorar. E como sabemos, uma vez que um modelo de receita é estabelecido, é muito difícil desistir.
O mesmo debate sobre notícias falsas e polarização nas mídias sociais: quando gera receita, é difícil convencer os responsáveis a combater o problema.
Tudo isso em um momento de enormes dificuldades financeiras enfrentadas pela maioria dos veículos.
Mas para quem usa esse argumento, deixo um aviso: estamos vivendo talvez o pior momento para o jornalismo, que tem sido alvo de ataques de todos os lados. Este ponto também deve ser considerado quando se pensa sobre isso.