Esta semana estarei falando sobre outro assunto que me intriga muito: o espaço dado às pessoas trans na realização de suas próprias vidas. Como os corpos se tornaram públicos e, portanto, sujeitos a todos os tipos de escrutínio e julgamento, perdemos toda individualidade e livre arbítrio para tentar ser o que queremos ser; estamos sempre à mercê de apoiar os cis.
E com esse plano, convidei Victoria Dandara Toth, estudante de Direito da Universidade de São Paulo, para compartilhar sua experiência que aconteceu com ela recentemente: ela participou de uma entrevista para um projeto de diversidade. Cerca de 30 pessoas em processo seletivo; ela era a única pessoa travesti.
“Como travesti que, por muita luta e privilégio, ocupa espaços mais elitistas, sempre me deparo com públicos exclusivamente cisgêneros. No entanto, o que me incomoda é que esses espaços normativos querem falar de diversidade e inclusão sem convidar travestis e pessoas trans para a mesa”.
É problemático pensar que, quando se trata de defender a diversidade, ela é quase inexistente. Acho que em muitos lugares o protagonista da história é um homem branco, cisgênero, de classe média; representantes de outras nomenclaturas e outras realidades sociais são, digamos, um subordinado. Tanto é que há movimentos que defendem o separatismo total da sigla LGBTI +. E não ajuda em nada.
Nas palavras de Victoria, “quando questionados, esses grupos sempre se colocam em defesa e puxam a defesa e a salvação do transgenerismo para o claro papel de ‘salvador cisgênero. Somos o objetivo do debate, mas nunca os debatedores, nunca os narradores de nossas próprias histórias e demandas”.
Isso falta, não temos espaço para contar nossas próprias histórias. Tenho meu próprio espaço, mas tão pequeno considerando a riqueza de histórias interessantes sobre pessoas LGBTI +, especialmente pessoas trans. Estamos sempre sob a proteção de pessoas cis que confirmam ou cancelam nossas palestras. A verdadeira transformação em direção à aceitação deve começar aí: reconhecendo que as pessoas podem falar por si mesmas, sem a aprovação tácita ou explícita de outra.
“Todo e qualquer projeto que queira se unir em nossa luta deve nos colocar à mesa como iguais, nos ouvir e ressoar com nossas vozes, não sequestrá-los e usá-los como escudo para justificar seu interesse em aumentar a mídia ou o capital social como “É fácil, se você quiser espaços inclusivos, incluir travestis e pessoas trans.”
Com estas palavras Victoria conclui a reflexão: quanto estamos disponíveis para compreender as falas dos outros sem interrompê-las ou não colocar a nossa opinião como parâmetro que confirma ou cancela tal discurso?