Um dos pioneiros em investigações cibernéticas no país, o especialista e advogado Paulo Quintiliano defende a necessidade urgente de modernizar a lei para combater esse tipo de crime. Para ele, novas situações nos últimos anos, como criptografia, inteligência artificial, criptomoeda e ataques cibernéticos com efeitos globais trazem a necessidade de tornar as sentenças mais difíceis para “desmotivar os autores”.
Quintiliano tem experiência com o assunto: iEm 1996, começou a trabalhar na área de tecnologia da informação da PF (Polícia Federal) e, posteriormente, na Interpol. internacional Criminoso Polícia Organização), como diretor da polícia forense em Lyon (França).
Atualmente, o Congresso está debatendo o projeto de lei 2630/2020, chamado “PL das fake news”, para combater o uso indevido de desinformação nas mídias sociais. Os opositores da proposta argumentam que ela poderia incentivar a censura e a autocensura. Quintiliano o mesmo é dito para esta equipe.
“Entendo que é melhor deixá-lo como está e respeitar o princípio constitucional da livre expressão do pensamento. No caso de publicar mensagens ofensivas que possam ser configuradas como crimes, o autor deve ser responsável nas esferas civil (danos morais) e criminais (punição de liberdade)“, ele explica.
O advogado acredita que o Brasil está bem equipado com tecnologia para investigar crimes digitais, mas defende mais qualificações de policiais e um plano global de ação contra criminosos.
Viés – Você pode resumir sua experiência no campo de crimes cibernéticos na Polícia Federal?
Paulo Quintiliano – Minha experiência começou em 1996, como perito criminal federal em informática, na Polícia Federal. Fomos pioneiros no Brasil nessa área. Eu trabalhei no caso do Banco Nacional [que em 1995 criou mais de 600 contas fantasmas e gerou um rombo de US$ 9,2 bilhões], em operações antifraude conhecidas como fraude de phishing [tentativa de roubar contas usando sites falsos como “iscas”]e, entre outros, contra o abuso infantil pela Internet.
Houve muitos casos em que evidências que poderiam provar crimes foram armazenadas em terras distantes. Na Interpol, em Lyon (França), como diretor de polícia forense, trabalhei em vários casos em que a cooperação internacional é fundamental para alcançar um resultado bem-sucedido nas investigações.
Em 2016, me aposentei da polícia federal e comecei a trabalhar como especialista e advogado na área de direito cibernético. Investiguei a solução de fraudes contra correntistas, notícias falsas e ataques em homenagem a políticos por meio de redes sociais e blogs. Atualmente estou presidindo [seção Brasilia] da HTCIA (High Technology Crime Investigation Association), uma organização internacional para investigação de crimes de alta tecnologia.
Viés – Na sua experiência, quais são os desafios que o Brasil enfrenta em termos de estrutura para combater o cibercrime?
Paulo Quintiliano – A polícia federal está muito bem estruturada para combater crimes cibernéticos. Possui especialistas e as mais modernas ferramentas de software e hardware do mercado de tecnologia. Algumas polícias civis também têm uma boa estrutura. No entanto, eles ainda não têm um número suficiente de policiais especializados, o que torna impossível resolver todos os casos dentro de um prazo razoável.
Os maiores desafios estão no crime cibernético com efeitos globais, onde existem evidências de identificação e localização de criminosos em muitos países com suas próprias leis. Daí a necessidade de rápida cooperação policial internacional. Como exemplo, podemos mencionar ataques de “resgate” nos quais dezenas de países são atacados ao mesmo tempo, gerando ganhos multimilionários para criminosos.
Também é um desafio investigar crimes de hackers com conhecimento avançado de técnicas anti-previstas. Nesses casos, os criminosos querem destruir evidências que possam provar o autor do crime e usar técnicas de segurança da informação para obstruir a investigação, como redes abertas, criptografia, redes VPN, dark web e outros recursos disponíveis.
Viés – Os criminosos ainda conseguem permanecer anônimos ou todo crime cibernético deixa uma marca?
Paulo Quintiliano – Certamente há vestígios em tudo o que é feito na Internet. O postulado número um da pesquisa cibernética pode ser considerado o fato de que um endereço IP válido é importante para o acesso à Internet, seja “web de superfície”, “web profunda” ou mesmo “web escura”.
Hackers com conhecimento avançado de técnicas anti-forenses procurarão, de qualquer maneira, encobrir ou ocultar esse endereço. No entanto, é certo que o anonimato absoluto não existe na Internet, pois sempre haverá um IP válido.
Viés – E o que precisamos melhorar na legislação aqui no país?
Paulo Quintiliano – Nossa legislação sobre questões cibernéticas vem evoluindo recentemente: temos o Marco Civil para a Internet, a Lei Geral de Proteção de Dados e várias leis raras que entraram em vigor em 1996. No entanto, o processo legislativo está avançando muito lentamente.
Portanto, nossa legislação precisa evoluir muito para preencher as lacunas criadas pela alta tecnologia, como criptografia, inteligência artificial, criptomoeda, ataques cibernéticos com efeitos globais, entre outras novas situações.
Os crimes existentes, como roubo por fraude, fraude, difamação, difamação, entre outras coisas, quando praticados online, aumentam seus potenciais ofensivos de maneira estratosférica. Portanto, a legislação precisa ser atualizada para permitir penalidades mais altas por crimes, quando praticada on-line.
Seria muito bom para o código do consumidor disciplinar e proteger as criptomoedas. A tecnologia Blockchain também deve ser disciplinada. A Lei Carolina Dieckmann criou a seção 154-A do Código Penal referente aos crimes de invasão do sistema e a criação e disseminação de código malicioso, mas previa uma sentença pequena de três meses a um ano na prisão. As penalidades por crimes digitais precisam ser aumentadas para desmotivar os autores.
Viés – Quanto às notícias falsas, o que você acha que pode ser feito?
Paulo Quintiliano – A questão das notícias falsas é bastante complexa. Nossa Constituição diz que a expressão dos pensamentos é livre e o anonimato é proibido. Claro, essa liberdade tem seus limites. Entendo que a fronteira é o ponto em que os crimes são cometidos, especialmente contra a honra.
Por outro lado, faz parte da livre expressão de publicações de pensamento de críticas contra terceiros, mesmo que sejam diferentes da realidade e desde que não sejam configuradas como crime.
Assim, sou contra a criminalização de notícias falsas, devido à conseqüente restrição da liberdade de expressão e ao surgimento da censura. Entendo que é melhor deixá-lo como está e respeitar o princípio constitucional da livre expressão do pensamento. No caso de publicar mensagens abusivas que possam ser configuradas como crimes, o autor deve ser responsabilizado nas esferas civil (compensação por danos morais) e criminal (liberdade de liberdade).